_ Querida, o dia já amanheceu.
Acordar cedo lhe era uma raridade. Manhãs, para ela, eram fastiosas demais para que representassem algum valor. Para que ver o sol nascer, se este perdura por todo decorrer do dia? Só o efêmero a atraía. Quanto mais fugaz uma paixão, mas ardente ela seria. Quando mais curto um beijo, mais inesquecível ele se tornaria. Quem se sacia, priva-se do desejo. E que seria da vida sem desejos?
Por isso, as nesgas de claridade que lhe invadiam o quarto não possuíam beleza, eram apenas infortúnios. E o cantar tênue os pássaros, apenas rompiam o sublime silêncio da alvorada. Porque os pássaros não cantavam ao entardecer? Oh, doce tarde. O ápice das vinte e quatro horas – quase eternas – que preenchiam o vazio dos seus dias. Quentes, cheias duma luz firme. Não dessas luzes fracas que oscilam com qualquer rastro fino de nuvem. Mas a luz incandescente do meio-dia, que faz semi-cerrar os olhos ao mirar o céu, e lavar o rosto para secar o suor. Sim, a luz forte que logo dava lugar ao anoitecer. Oh sim, o horizonte todo pincelado em tons alaranjados... Como era bonito de ver os pedaços de sol escondendo-se detrás das montanhas.
E então, quando pensava ter esvaído do firmamento tudo que poderia despertá-la louvor, um olhar tímido, cinza-prateado, surge sobre a terra. É ela: a deusa dos amores impossíveis, que acende as chamas adormecidas, bombeadas por corações. A lua sim, era verdadeiramente bela. Tão bela que em apenas poucas horas, banha as ruas com seu fulgor, e enche de paixão os casais sentados à praça. Humilde, divide sua brilhância com outras crianças: aqueles pontinhos claros do negro que, carinhosamente, ela chamou de estrelas. E ainda, temendo enfastiar os amores com o marasmo da sua luz branca, a lua desaparece por um tempo. E mesmo quando todos parecem dormir, esquecê-la em sua penumbra, ela não chora. Apenas cresce, incha. E deslumbra até ser notada.
_ Deixa-me mamãe! Acorda-me apenas quando a noite chegar, pois correrei a beira mar, e esperarei por um táxi lunar.
_ Não seja tola, minha criança. Não existe esse táxi que dizes. Levanta-te e vai banhar-te de sol. Vai banhar-te de vida, menina!
_ Oh, então tu não sabes? Não es tu, minha verdadeira mãe. Eu sou uma estrela! Não te lembras quando eu cheguei por cá? Não te lembras duma estrela que caía quando imploraste aos Deuses por uma menina para criar?
_ Não te enganes, meu bem. Fui eu quem contou para ti essa estória. Não fantasies além da conta. Desgostas-te dos meus valores? Não me olhes desta forma. Oh, agora entendo! Queres deixar-me, desembestar pelas estradas como teu irmão! Não vês que meu coração não agüenta outro filho perdido no mundo? Tu não tens piedade da tua pobre mãe?
Ela quis decrescer devagar, tal qual a lua mingua para alcançar a fase nova. Era tão errado ansiar por outro mundo? Um mundo onde as criaturas brilham livres, e as que não brilham, vestem-se do brilho doutros. E os outros, sempre bons, não cobram dinheiro ou favores; apenas sorriam alegres com raios de puro cetim, por estarem disseminando em seu mundo, um pedacinho a mais de si.
Sentia-se, porém, mesmo uma tola. Como podia ser uma estrela, se não possuía brilho próprio nem irmãos para emprestá-lo? Sua mãe estava certa (mães estão sempre certas). Ela era mulher. Mulher de corpo, de carne. Ah! – um sorriso surgiu. Corpo, carne, mas não de alma! Ela nascera de um ventre, mas tinha alma de astro. Não podia seu Deus, dar-lhe, uma chance que fosse, de conhecer a lua mais de perto? Uma noite lhe seria mais que suficiente! Queria apenas olhar no íntimo dos olhos prata que a espiavam. E queria saltitar no algodão doce das nuvens, esconder-se nos buracos negros e inspirar poeira cósmica. Queria abraçar as estrelas e olhar a terra de longe. Os oceanos, tão azuis, vibrando, enérgicos, com a chegada da chuva.
Mas Deus não parecia ouvi-la, ou ouvia e não lhe dava importância. Estaria chamando-a de tola também? Oh! A chuva que banharia os rios, tornou-se salina, tocou-lhe o lábio. Era uma lágrima. Uma lágrima gelada de angústia, por saber que estrelas não choram.
_ Perdoa-me mamãe. Não hei de importuná-la novamente com minhas asneiras.
_ Isso! Levanta-te dessa cama e deixa que tanto alvoroço. Aceita-te de uma vez e acalma meu coração de mãe. Quero-te feliz, criança! Quero-te muito feliz!
Ser feliz? Em que consiste felicidade? Não são os sonhos que a constroem? Pois se assim for, a felicidade dela estaria agora em pedaços, e cingia mortiça sob seus pés, como cacos de vidro estraçalhado. E em cada estilhaço uma cor, uma imagem, um sorriso. As cores que, um dia, lhe tingiram o mundo; as imagens que, um dia, lhe ocupavam a mente; e o sorriso – aquele sorriso - que, um dia, lhe luzira nos lábios. Tudo, porém, se fora com a brisa. Todo o tudo que importava: os sonhos.
_ De que me vale viver agora, meu Deus?
Ela clamava aos céus. As lágrimas ressumando na face deixava-lhe vazia, como fosse sangue escorrendo por suas veias. E os pés, cortados do vidro infeliz, doíam conforme encontravam-se com areia fina. Lá estava ela, a beira mar, deixando-se guiar por tudo que lhe restava. Como é mesmo que chamam? Sim, esperança.
O horizonte, aos poucos, pincelou-se dum vermelho amarelado, e as aves, em bandos, voavam com o vento, buscando por seus iguais.
A menina, sozinha, secando uma gota cristalina vertente em suas feições cândidas de meninas, sentou-se defronte ao imenso azul que, em algum lugar no infinito, unia-se com o negro opressivo que se estendia para um grande abraço. Jogou uma pedra n’água, e círculos formaram-se nela. Um, outro, e mais um. Veio-lhe então uma dúvida: Não poderia ser ele - o mar - seu aliado? Ouvira dizer por aí, por bosques, ruas e avenidas, de uma célebre paixão secreta entre o azul-marinho e o prata-cetim. Seria, então, verdade quem eram amantes? Ou não passava de uma lenda?
Envolveu os próprios joelhos num abraço, e enquanto as lágrimas voltavam a jorrar, implorou, humilde, ao oceano.
_ Tu, poseidon, podes ouvir meu lamento? Leva-me contigo, eu imploro! Leva-me contigo ao firmamento. Prometo - e não duvides de mim - que enquanto for-me permitido viver, rogarei ao Senhor por ti, e pela paixão que faz mover tua maré.
Uma brisa mais forte soprou, e a água, antes quieta, do mar, se agitou.
A menina abraçou-se um pouco mais. Seria uma resposta? Teria o mar, ouvido seu lamento e testemunhado sua dor?
_ Eu sei que tu podes me ouvir! Tuas águas falam por ti! Eu prometo, oh mar! Prometo mesmo rogar por ti.
_ E o que te levas a pensar, criança, que tuas preces farão meu destino mudar? Se, embora tu vivas a orar, nunca conseguiste mudar o teu?
Respondeu o mar. E as ondas vieram banhar-lhe os pés. Estava certa, aquela voz. Como ela, menina que era, poderia fazer acontecer uma paixão alheia, se nem a própria paixão conseguira alcançar? Estava certa, aquela voz. Não havia mais sonhos, pelos quais pudesse lutar.
_ Não te culpo por duvidares da minha fé, pois até eu, que sou dona dela, sinto-me balançar. Porém, diga-me tu, que és tão maior e mais bravo. Porque a tua fé e a tua força, não trouxeram para ti, o teu amado luar?
Por um longo tempo, não houve resposta. E a grande lua, melancólica, que passou a espreitá-los, pela primeira vez, pôs-se a chorar. Chorou rios de raios prateados, que refletiam, sublimes, no espelho silencioso do mar. Reclamava, a mãe gentil, onde esse romance poderia chegar? Luz e água não se tocam! Deveriam, pois, resignar-se no destino ímpio que os designava a apenas se admirar.
A menina, não mais sozinha, chorou também com a alma pesada. Oh, o que sua loucura viera acarretar! A mais bonita das lendas dissipava-se em discussões, e tudo por uma mera tolice, que ousara questionar. E agora? O que seriam das noites, se todo brilho do luar escorresse pelos fios brancos que mergulhavam, ferozes, no mar? E o que seria dela, mulher, sem aquele belo olhar acalentando-a num sono brando e ensinando-a as graças de amar? Ou dela, estrela, sem o fulgor maior de mãe para ensiná-la a brilhar? Só agora via o quanto fora egoísta em arriscar o mais célebre amor do mundo, apenas para continuar a sonhar.
_ Não chores mais, oh! Lua. Não chores mais, meu caro mar. O erro foi meu em julgar tua fé, quando nem mesmo a minha consigo controlar. Porque fraquejam tão certo? Vamos! Digam-me! Não vêem? Não há motivos para lágrimas, pois o amor perdura para sempre, e caso não o saibam... A eternidade os pertence!
_ Quem és tu para falar do eterno, menina? Quem és tu para falar-nos de força? Não foste, justo tu, quem desistiu tão cedo dos teus desejos? Não eras tu quem tanto repudiava o tempo?
_ Sim! Sim! Não nego, minha mãe. Fui cega, oh! Como fui cega! Mas agora eu posso ver... O fugaz tem sua beleza, é verdade, mas o eterno... Oh, o eterno é divino! E se tu, por acaso, quiseres saber, meu coração acaba de inundar-se em esperança novamente. Meu corpo é pura carne. Não vê? Minha pele nada significa! Esperarei, pois, aqui, apreciando os nasceres do seu irmão, o sol. E um dia, tenho fé, me libertarei deste mundo que cá me encontro e adentrarei o teu, se assim for p’ra ser.
Os olhinhos pequenos encheram-se de uma ternura cintilante, que se fez maior quando, ajoelhando-se sobre os grãos de areia, juntou as mãos, cerrou os olhos e clamou aos céus numa oração.
_ Senhor, sei que tu, que tens tantos homens por quem zelar, cansas de tanto me ouvir. Faço-te agora, porém, o meu pedido final: Deixa-me aqui em meu canto, oh Senhor! Aprendendo a ser mulher. Deixa-me viver ofuscada na sombra, sem brilho e até mesmo sem cor. Mas poupa-me de carregar em meus ombros, a morte desse tão grande amor.
Os cabelos da menina dançavam ao sabor dos ventos que haviam vindo do norte apenas para testemunhar aquele momento. Todos conheciam aquela criatura pueril, que mesmo sem conhecer muito da vida, lhes era um exemplo de perseverança. Dentre todos os ambiciosos, fora ela, tão jovem, a mais obstinada. Quem já se viu gente querer ser estrela? Riam-se os planetas lá do alto.
Mas foi Deus, revolto num mar de anjos, que declarou o parecer.
_ Então é verdade que tu, após tanto suplicar, te abstém do teu maior desejo por um amor que, sequer, pertence a ti?
_ Não, Senhor. Abstenho-me do meu maior desejo por um amor que pertence ao mundo. Os homens afogar-se-iam em trevas escuras, sem um luar apaixonado para os guiar.
_ E não são as estrelas, a tua família? Porque te importas com o homem?
_ Fossem pedras, as prejudicadas, ainda assim, eu me importaria.
Os anjos - com suas pequenas asas golpeando o ar – sorriram ao seu Senhor. E uma melodia suave apossou-se do silêncio com versos fáceis que diziam mais ou menos assim:
Acordar cedo lhe era uma raridade. Manhãs, para ela, eram fastiosas demais para que representassem algum valor. Para que ver o sol nascer, se este perdura por todo decorrer do dia? Só o efêmero a atraía. Quanto mais fugaz uma paixão, mas ardente ela seria. Quando mais curto um beijo, mais inesquecível ele se tornaria. Quem se sacia, priva-se do desejo. E que seria da vida sem desejos?
Por isso, as nesgas de claridade que lhe invadiam o quarto não possuíam beleza, eram apenas infortúnios. E o cantar tênue os pássaros, apenas rompiam o sublime silêncio da alvorada. Porque os pássaros não cantavam ao entardecer? Oh, doce tarde. O ápice das vinte e quatro horas – quase eternas – que preenchiam o vazio dos seus dias. Quentes, cheias duma luz firme. Não dessas luzes fracas que oscilam com qualquer rastro fino de nuvem. Mas a luz incandescente do meio-dia, que faz semi-cerrar os olhos ao mirar o céu, e lavar o rosto para secar o suor. Sim, a luz forte que logo dava lugar ao anoitecer. Oh sim, o horizonte todo pincelado em tons alaranjados... Como era bonito de ver os pedaços de sol escondendo-se detrás das montanhas.
E então, quando pensava ter esvaído do firmamento tudo que poderia despertá-la louvor, um olhar tímido, cinza-prateado, surge sobre a terra. É ela: a deusa dos amores impossíveis, que acende as chamas adormecidas, bombeadas por corações. A lua sim, era verdadeiramente bela. Tão bela que em apenas poucas horas, banha as ruas com seu fulgor, e enche de paixão os casais sentados à praça. Humilde, divide sua brilhância com outras crianças: aqueles pontinhos claros do negro que, carinhosamente, ela chamou de estrelas. E ainda, temendo enfastiar os amores com o marasmo da sua luz branca, a lua desaparece por um tempo. E mesmo quando todos parecem dormir, esquecê-la em sua penumbra, ela não chora. Apenas cresce, incha. E deslumbra até ser notada.
_ Deixa-me mamãe! Acorda-me apenas quando a noite chegar, pois correrei a beira mar, e esperarei por um táxi lunar.
_ Não seja tola, minha criança. Não existe esse táxi que dizes. Levanta-te e vai banhar-te de sol. Vai banhar-te de vida, menina!
_ Oh, então tu não sabes? Não es tu, minha verdadeira mãe. Eu sou uma estrela! Não te lembras quando eu cheguei por cá? Não te lembras duma estrela que caía quando imploraste aos Deuses por uma menina para criar?
_ Não te enganes, meu bem. Fui eu quem contou para ti essa estória. Não fantasies além da conta. Desgostas-te dos meus valores? Não me olhes desta forma. Oh, agora entendo! Queres deixar-me, desembestar pelas estradas como teu irmão! Não vês que meu coração não agüenta outro filho perdido no mundo? Tu não tens piedade da tua pobre mãe?
Ela quis decrescer devagar, tal qual a lua mingua para alcançar a fase nova. Era tão errado ansiar por outro mundo? Um mundo onde as criaturas brilham livres, e as que não brilham, vestem-se do brilho doutros. E os outros, sempre bons, não cobram dinheiro ou favores; apenas sorriam alegres com raios de puro cetim, por estarem disseminando em seu mundo, um pedacinho a mais de si.
Sentia-se, porém, mesmo uma tola. Como podia ser uma estrela, se não possuía brilho próprio nem irmãos para emprestá-lo? Sua mãe estava certa (mães estão sempre certas). Ela era mulher. Mulher de corpo, de carne. Ah! – um sorriso surgiu. Corpo, carne, mas não de alma! Ela nascera de um ventre, mas tinha alma de astro. Não podia seu Deus, dar-lhe, uma chance que fosse, de conhecer a lua mais de perto? Uma noite lhe seria mais que suficiente! Queria apenas olhar no íntimo dos olhos prata que a espiavam. E queria saltitar no algodão doce das nuvens, esconder-se nos buracos negros e inspirar poeira cósmica. Queria abraçar as estrelas e olhar a terra de longe. Os oceanos, tão azuis, vibrando, enérgicos, com a chegada da chuva.
Mas Deus não parecia ouvi-la, ou ouvia e não lhe dava importância. Estaria chamando-a de tola também? Oh! A chuva que banharia os rios, tornou-se salina, tocou-lhe o lábio. Era uma lágrima. Uma lágrima gelada de angústia, por saber que estrelas não choram.
_ Perdoa-me mamãe. Não hei de importuná-la novamente com minhas asneiras.
_ Isso! Levanta-te dessa cama e deixa que tanto alvoroço. Aceita-te de uma vez e acalma meu coração de mãe. Quero-te feliz, criança! Quero-te muito feliz!
Ser feliz? Em que consiste felicidade? Não são os sonhos que a constroem? Pois se assim for, a felicidade dela estaria agora em pedaços, e cingia mortiça sob seus pés, como cacos de vidro estraçalhado. E em cada estilhaço uma cor, uma imagem, um sorriso. As cores que, um dia, lhe tingiram o mundo; as imagens que, um dia, lhe ocupavam a mente; e o sorriso – aquele sorriso - que, um dia, lhe luzira nos lábios. Tudo, porém, se fora com a brisa. Todo o tudo que importava: os sonhos.
_ De que me vale viver agora, meu Deus?
Ela clamava aos céus. As lágrimas ressumando na face deixava-lhe vazia, como fosse sangue escorrendo por suas veias. E os pés, cortados do vidro infeliz, doíam conforme encontravam-se com areia fina. Lá estava ela, a beira mar, deixando-se guiar por tudo que lhe restava. Como é mesmo que chamam? Sim, esperança.
O horizonte, aos poucos, pincelou-se dum vermelho amarelado, e as aves, em bandos, voavam com o vento, buscando por seus iguais.
A menina, sozinha, secando uma gota cristalina vertente em suas feições cândidas de meninas, sentou-se defronte ao imenso azul que, em algum lugar no infinito, unia-se com o negro opressivo que se estendia para um grande abraço. Jogou uma pedra n’água, e círculos formaram-se nela. Um, outro, e mais um. Veio-lhe então uma dúvida: Não poderia ser ele - o mar - seu aliado? Ouvira dizer por aí, por bosques, ruas e avenidas, de uma célebre paixão secreta entre o azul-marinho e o prata-cetim. Seria, então, verdade quem eram amantes? Ou não passava de uma lenda?
Envolveu os próprios joelhos num abraço, e enquanto as lágrimas voltavam a jorrar, implorou, humilde, ao oceano.
_ Tu, poseidon, podes ouvir meu lamento? Leva-me contigo, eu imploro! Leva-me contigo ao firmamento. Prometo - e não duvides de mim - que enquanto for-me permitido viver, rogarei ao Senhor por ti, e pela paixão que faz mover tua maré.
Uma brisa mais forte soprou, e a água, antes quieta, do mar, se agitou.
A menina abraçou-se um pouco mais. Seria uma resposta? Teria o mar, ouvido seu lamento e testemunhado sua dor?
_ Eu sei que tu podes me ouvir! Tuas águas falam por ti! Eu prometo, oh mar! Prometo mesmo rogar por ti.
_ E o que te levas a pensar, criança, que tuas preces farão meu destino mudar? Se, embora tu vivas a orar, nunca conseguiste mudar o teu?
Respondeu o mar. E as ondas vieram banhar-lhe os pés. Estava certa, aquela voz. Como ela, menina que era, poderia fazer acontecer uma paixão alheia, se nem a própria paixão conseguira alcançar? Estava certa, aquela voz. Não havia mais sonhos, pelos quais pudesse lutar.
_ Não te culpo por duvidares da minha fé, pois até eu, que sou dona dela, sinto-me balançar. Porém, diga-me tu, que és tão maior e mais bravo. Porque a tua fé e a tua força, não trouxeram para ti, o teu amado luar?
Por um longo tempo, não houve resposta. E a grande lua, melancólica, que passou a espreitá-los, pela primeira vez, pôs-se a chorar. Chorou rios de raios prateados, que refletiam, sublimes, no espelho silencioso do mar. Reclamava, a mãe gentil, onde esse romance poderia chegar? Luz e água não se tocam! Deveriam, pois, resignar-se no destino ímpio que os designava a apenas se admirar.
A menina, não mais sozinha, chorou também com a alma pesada. Oh, o que sua loucura viera acarretar! A mais bonita das lendas dissipava-se em discussões, e tudo por uma mera tolice, que ousara questionar. E agora? O que seriam das noites, se todo brilho do luar escorresse pelos fios brancos que mergulhavam, ferozes, no mar? E o que seria dela, mulher, sem aquele belo olhar acalentando-a num sono brando e ensinando-a as graças de amar? Ou dela, estrela, sem o fulgor maior de mãe para ensiná-la a brilhar? Só agora via o quanto fora egoísta em arriscar o mais célebre amor do mundo, apenas para continuar a sonhar.
_ Não chores mais, oh! Lua. Não chores mais, meu caro mar. O erro foi meu em julgar tua fé, quando nem mesmo a minha consigo controlar. Porque fraquejam tão certo? Vamos! Digam-me! Não vêem? Não há motivos para lágrimas, pois o amor perdura para sempre, e caso não o saibam... A eternidade os pertence!
_ Quem és tu para falar do eterno, menina? Quem és tu para falar-nos de força? Não foste, justo tu, quem desistiu tão cedo dos teus desejos? Não eras tu quem tanto repudiava o tempo?
_ Sim! Sim! Não nego, minha mãe. Fui cega, oh! Como fui cega! Mas agora eu posso ver... O fugaz tem sua beleza, é verdade, mas o eterno... Oh, o eterno é divino! E se tu, por acaso, quiseres saber, meu coração acaba de inundar-se em esperança novamente. Meu corpo é pura carne. Não vê? Minha pele nada significa! Esperarei, pois, aqui, apreciando os nasceres do seu irmão, o sol. E um dia, tenho fé, me libertarei deste mundo que cá me encontro e adentrarei o teu, se assim for p’ra ser.
Os olhinhos pequenos encheram-se de uma ternura cintilante, que se fez maior quando, ajoelhando-se sobre os grãos de areia, juntou as mãos, cerrou os olhos e clamou aos céus numa oração.
_ Senhor, sei que tu, que tens tantos homens por quem zelar, cansas de tanto me ouvir. Faço-te agora, porém, o meu pedido final: Deixa-me aqui em meu canto, oh Senhor! Aprendendo a ser mulher. Deixa-me viver ofuscada na sombra, sem brilho e até mesmo sem cor. Mas poupa-me de carregar em meus ombros, a morte desse tão grande amor.
Os cabelos da menina dançavam ao sabor dos ventos que haviam vindo do norte apenas para testemunhar aquele momento. Todos conheciam aquela criatura pueril, que mesmo sem conhecer muito da vida, lhes era um exemplo de perseverança. Dentre todos os ambiciosos, fora ela, tão jovem, a mais obstinada. Quem já se viu gente querer ser estrela? Riam-se os planetas lá do alto.
Mas foi Deus, revolto num mar de anjos, que declarou o parecer.
_ Então é verdade que tu, após tanto suplicar, te abstém do teu maior desejo por um amor que, sequer, pertence a ti?
_ Não, Senhor. Abstenho-me do meu maior desejo por um amor que pertence ao mundo. Os homens afogar-se-iam em trevas escuras, sem um luar apaixonado para os guiar.
_ E não são as estrelas, a tua família? Porque te importas com o homem?
_ Fossem pedras, as prejudicadas, ainda assim, eu me importaria.
Os anjos - com suas pequenas asas golpeando o ar – sorriram ao seu Senhor. E uma melodia suave apossou-se do silêncio com versos fáceis que diziam mais ou menos assim:
Volta para nós, doce criança, que já sofreste por demais.
Voe junto com os pássaros, venha cá, encontrar seus iguais.
Mesmo na ausência dos sonhos, aprendeste tua lição.
Aprendeste que, o maior dos brilhos, fulge dentro do teu coração.
Voe junto com os pássaros, venha cá, encontrar seus iguais.
Mesmo na ausência dos sonhos, aprendeste tua lição.
Aprendeste que, o maior dos brilhos, fulge dentro do teu coração.
Harpas, violinos e violões. Fadas, elfos e Gnomos. Sois, luas e planetas. Mar, vento e areia. Todos pararam para testemunhar.
_ É um milagre! – Disse um anjo.
_ Não pode ser! – Replicou saturno.
Mas a menina, com o sorriso maior do mundo, começava a minguar, como houvesse uma cortina de nuvem, encobrindo-lhes o olhar. E ela diminuiu tanto, mas tanto, que transformou-se num único ponto. Um ponto claro, branco e brilhante, que, numa ascensão constante, emanava uma luz fraquinha, como uma rosa a desabrochar.
E não é que chegava, enfim, por lá, o tão esperado táxi lunar?
Dizem que a menina-estrela, depois de encontrar seus verdadeiros irmãos, dedicou-se em olhar por todos os homens: Seus irmãos coração.
_ É um milagre! – Disse um anjo.
_ Não pode ser! – Replicou saturno.
Mas a menina, com o sorriso maior do mundo, começava a minguar, como houvesse uma cortina de nuvem, encobrindo-lhes o olhar. E ela diminuiu tanto, mas tanto, que transformou-se num único ponto. Um ponto claro, branco e brilhante, que, numa ascensão constante, emanava uma luz fraquinha, como uma rosa a desabrochar.
E não é que chegava, enfim, por lá, o tão esperado táxi lunar?
Dizem que a menina-estrela, depois de encontrar seus verdadeiros irmãos, dedicou-se em olhar por todos os homens: Seus irmãos coração.
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