31 de março de 2009

Ciranda

A vida hoje me pregou uma peça. E parece que é sempre assim; ela (a vida) se diverte nos fazendo de bobos. E os tiros saem pela culatra, a verdade se contradiz, os sentimentos se invertem, e (aí) a trama toda se complica; e o mocinho vira vilão, o príncipe vira sapo, a princesa cai da torre e o dragão a segura, voando pelos céus com suas asas de anjo (que caiu). Se esperamos demais por algo, surge a decepção, vinda não sei de onde, só pra atazanar. E quando já estamos cansados dela, desmotivados e decididos a jogar tudo pro alto, acontece "aquela coisa" que faz tudo mudar. É nessa hora que as cores se tornam mais intensas, e até o preto parece mais cinza, o branco quase vira luz. De repente, toda música que toca, toca pra você; e os cheiros te lembram os cheiros daqueles outros cheiros que você sentiu e gostou.

Acho que é daí que vem aquela idéia de pensamento reverso; de ficar pensando no não para ver se vem um sim... mas eu não acredito nisso. Minha teoria é que tudo são pontos de vista, e só. Quando o contentamento é grande, o brilho dos olhos ofusca “aquelas coisinhas” que seriam “grandes coisas” se pudéssemos enxergá-las. Chamo isso de ponto cego. E qual a solução? Não tem. E pra que solução? É tão bom quando a peça que a vida prega é a peça que estava faltando para nosso quebra-cabeça! (que quebra, e fica de ponta cabeça, e muda conforme a gente muda) Eu aconselho escrever um livro, pra relembrar quantas vezes der na telha o gosto daquela velha surpresa, e esperar por mais. E quando o mais não vier, e a decepção chegar, blá blá blá blá, pois eis que chega a roda viva... e tudo volta pro lugar.

22 de março de 2009

Homem fiel

Ele estava completamente concentrado em seus relatórios diários quando bateram à porta. Parou por um instante, elevando um pouco o queixo, depois voltou a escrever.
Novamente, bateram à porta.
– Senhor, posso entrar?
Era uma voz feminina, quase sensual. Melíflua, parecia que deslizava nos ouvidos dele. A famosa voz de travesseiro, que, como se feita de pluma, se abraça com o vento e fica dando voltas e voltas até finalmente cair (ou sumir – como um sussurro).
Mesmo sentindo-se tentado, ele se limitou a um “uhum”. Não tinha tempo para comportamentos adolescentes, apesar de sentir-se altamente excitado com a idéia de ter um caso com sua belíssima secretária. Além do mais, era um homem casado, não deveria prestar-se àqueles pensamentos infames.
Ela entrou na sala. Usava uma saia justa – na altura do joelho – e um suéter carmesim. Tinha os cabelos presos, mas alguns fios escapavam ao penteado, emoldurando-lhe o bonito rosto, contemplado com um par de belos olhos verdes. Um semblante impecável, não fossem as olheiras escuras abaixo dos olhos e o nariz levemente corado, como quem andou chorando.
Entretanto, apesar da aparência estonteante da mulher e do impulso devastador de oferecer-lhe algum consolo, ele continuou concentrado na papelada sobre a escrivaninha... Precisava se controlar.
– Senhor, é a terceira vez que sua esposa liga. Ela parecia angustiada... Você não deveria atender a ligação?
– Não. Ela sabe que não deve me incomodar durante o trabalho.
– Mas senhor, parece ser muito importante.
– Pois diga a ela que resolveremos tudo quando eu chegar em casa.
– Mas o senhor sempre chega muito cansado em casa, e acaba dormindo durante as discussões.
– Isso não é de todo verdade. – ele disse, sem desviar a atenção dos papeis, resistindo à atração quase magnética que o decote dela exercia sobre seus olhos. – Me sirva um pouco de café, por favor.
– Realmente, é uma verdade incompleta. O Senhor dorme durante o sexo também! – ela acusou, enquanto enchia um copo na máquina de café expresso.
– Mas isso é um absurdo! Não vou discutir minha vida sexual com minha secretária.
– E sua esposa.
– O que disse?
– Sua secretária e esposa.
Ele olhou-a por cima do copo, com uma sobrancelha arqueada. Parecia furioso.
– Onde você quer chegar? Nós já combinamos que aqui eu sou apenas o seu patrão, e como tal, mereço seu respeito integral. Não posso tolerar esse tipo de comportamento, entendeu?
– Pois eu me demito!
– Está bem. Esse é seu aviso prévio? Quando pretende deixar a empresa?
– Você não entendeu, eu me demito como sua esposa!
O homem pareceu chocado ao ouvi-la, e suas feições passaram por uma seqüência de cores e expressões, entre vermelho-raiva, roxo-indignação e cinza-tristeza.
– Se é o que você quer... Mande seu advogado falar comigo mais tarde para resolvermos a questão do divorcio. Pode ir.
Ela sentiu um aperto na garganta, os olhos ficaram embaçados; a voz saiu embargada de um choro iminente, contido pelo orgulho.
– Sim senhor. Eu... – como não pudesse completar, ela simplesmente deu-lhe as costas para se retirar, mas ele a impediu.
– Espere! - chamou. - Eu e a minha esposa, nós já estamos tecnicamente separados, não é?
– Sim. Você está completamente livre, se é isso que quer saber.
E então um braço forte a envolveu de repente, e seu corpo chocou-se com o corpo másculo do homem, agora de pé à sua frente. Ele ofegava, e ela sentiu uma onda de calor subir por seu corpo quando as mãos dele pousaram-se bruscamente sobre suas pernas, e suas bocas encaixaram-se num beijo faminto, cheio de desejo.

Ausente.

Ausente em mim, é como estou me sentindo. Como se faltasse um pedaço meu, algo que perdi no caminho, que caiu da mochila. Eu procurei, tentei reconstruir meus passos, mas acho que os pássaros comeram as migalhas de pão que deixei marcando o caminho... É difícil explicar o que estou sentindo, porque, na verdade, o que estou sentindo é a ausência do sentimento; do sentimento que antes queimava forte dentro de mim, me motivando, me dando asas, e agora parece morrer, parece que está sendo soterrado por um furacão de sensações estranhas,que eu nunca tinha provado. Estou com medo, com frio, e eu me sinto tão só! As paredes tão brancas parecem que estão se comprimindo ao meu redor, e eu me sinto tão fraca, tão frágil! Eu não tenho mais forças para fingir, eu simplesmente estou perdida entre o abismo que existe entre o que eu sou e o que eu planejei ser. Tudo devia ser tão diferente... eu queria que fosse tão diferente! Eu queria um sinal de que não vou me frustrar de novo se investir mais de mim nisso, ou o que sobrou de mim. Eu não tenho mais sonhos, sonhos de verdade, aqueles que você acorda querendo continuar dormindo, e fecha os olhos para tentar começar de onde parou... eu não os tenho mais, sequer me lembro da última vez que sonhei. E eu não faço mais planos, não consigo pensar em como vai ser o futuro, mesmo que o futuro seja tão próximo quanto o amanhã. Eu não consigo mais ser otimista, não consigo mais encenar minha força de vontade, porque eu não tenho força e nem vontade! Eu estudo compulsivamente, eu me escondo atrás dos livros, tenho tanto medo que eles me engulam, que eu engulo eles. Mas só consigo me desesperar mais, me sentir mais fraca, mas incapaz! E mais só! Eu estou ficando só! Não me deixem só! Eu estou com tanto medo! E as paredes, essas paredes brancas, elas estão se fechando tão rápido... e o telefone, ele tá mudo, eu estou muda, com aquele bolo na garganta, aquela coisa estranha na boca do estômago... Eu preciso de ajuda. Minha mãe estava certa, afinal. Eu estou me fechando dentro de mim, mas aqui dentro é tão frio e tão solitário!

18 de março de 2009

Semáforo


Acho que, sem perceber, nós passamos a viver no automático. Não olhamos mais pela janela, pois já conhecemos a paisagem; e, se não olhamos, não percebemos que a paisagem nunca é a mesma. São tantos detalhes que deixamos de ver, tanta coisa que deixamos de viver por presunção, por achar que o nosso tempo é precioso demais para gastar com capítulos repetidos, que esquecemos que sempre há segredos escondidos nas entrelinhas das histórias... segredos que poderiam mudar nosso dia, e porque não nossa vida? Talvez haja, entre aqueles tantos personagens coadjuvantes dos nossos dias, um protagonista escondido; e tudo que precisamos é notar o seu sorriso. Pense nisso. Pense no semáforo! E aproveite para diminuir os acidentes de trânsito rs.

14 de março de 2009

São sentimentos.

Quando estamos tristes, parece que há uma bomba de sucção dentro do nosso peito, sugando todas as boas emoções e sensações, sem nos deixar senti-las ou vivê-las. Entretanto, acho que a culpa é nossa. Nós nos apegamos tanto à nossa tristeza que ela, de repente, parece maior e mais forte. É como numa queda infinda: chega um ponto que nós paramos de gritar, mas continuamos a ouvir os ecos do nosso próprio desespero, quando ele na verdade já se foi, e somos somente nós e a gravidade. Mas se formos pensar, cair não é tão ruim... é só colocar o mundo de cabeça pra baixo e pronto, estamos subindo! Há sempre duas versões pra tudo, dois pontos de vista, ou até mesmo mais. O que nos falta é, afinal, um pouco mais de fé para acreditar que nada é vão, embora assim pareça quando estamos tristes ou magoados demais. O segredo é inverter as coisas. Como seres pessimistas que somos, mesmo quando estamos no auge de um grande amor, surge aquela duvida chata, alfinetando a nossa felicidade instantânea: “e quando o amor acabar?” Temos sempre um pouco de medo de nos entregar, por saber (mesmo sem saber que sabemos) que as coisas na vida são muito efêmeras. Hoje estamos loucamente apaixonados, amanhã descobrimos que aquela pessoa não era para nós. Porque não fazer o contrário, então? Pensar que o amor é pra sempre e que a tristeza pode acabar a qualquer momento? É disso que eu estou falando: de prolongar coisas boas e resumir as ruins; de aproveitar o que a vida oferece de bom e aprender com o que há de ruim, sem essa de pensar que vai ser ruim pra sempre. Conhece o jogo do contente? Se não, posso resumi-lo em uma palavra: otimismo. A verdade é que sentimentos são mesmo fáceis de mudar, e nós somos mesmo umas metamorfoses ambulantes. Contudo, como tudo, nós sempre podemos esperar que mudem para melhor, não é?

12 de março de 2009

...




















- mãããe, eu não quero fazer terapia!
- disso eu já sei, mas me dê um bom motivo para dizer não a algo que você nem conhece...
- eu acho que sou capaz de superar meus problemas sozinha.
- eu disse um bom motivo!
- e?
- bons motivos não começam com “eu acho”.
- ok. então me dê um bom motivo para eu fazer terapia...
- eu acho que você está se fechando cada vez mais para os outros.
- “você acha” não é um bom motivo!
- isso não conta quando quem acha é sua mãe.

Então, a partir de hoje, o blog fica aberto para comentários! Prova de que posso me abrir para os outros... [colocação estranha] ahm... posso ser menos fechada para os outros [agora sim!] sem terapia! (não posso?)


5 de março de 2009

Poligamia













Éramos quatro:
Você e ela
Ele e eu
Você beija ela
Ele beija eu
Se eu emprestar ele pra ela
Posso te chamar de meu?

2 de março de 2009

A primeira vista

– Posso me sentar aqui?
A moça de grandes olhos fitou-o por segundos, mas a ele os segundos pareceram se prolongar por uma, duas, quem sabe três horas. Os olhos dela eram como dois imensos buracos negros; tragavam-no e transportavam-no para outra dimensão, onde ele mandava e o tempo atendia.
Embaraçada, ela desviou o olhar e sorriu um sorriso tímido.
Ele se sentou.
– Você tem belos olhos. – e disse se inclinando sobre a mesa, aproximando um pouco mais o rosto do dela. Ela se afastou um pouquinho, o sorriso tímido se alargou, as bochechas, outrora alvas como papel, tornaram-se rubras e quentes.
– Você vem sempre aqui, não é? – ele continuou a falar – oh, por favor, não pense que essa é uma daquelas cantadas baratas. Eu disse isso porque sempre a vejo por aqui, sentada nessa mesma cadeira. Essa não foi a primeira vez que quis me sentar contigo, na verdade, todos os dias eu ensaio palavras pra lhe dizer, fico inventando pretextos para chegar mais perto, qualquer coisa para puxar assunto; até pensei naquele velho truque de esbarrar... mas toda vez que eu lhe via, eu pedia a coragem. Não sei, acho que é esse seu jeito de olhar, que parece que tá me vendo por dentro, que parece que eu to sem roupa, sem pele, se nada; parece que sou apenas um coração acelerado sobre duas pernas trêmulas, falando compulsivamente a cada batimento. Eu sei, você deve está me achando um grande idiota, talvez até esteja prendendo o riso agora, mas eu não me importo; porque eu sou mesmo um grande idiota, mas sou um idiota apaixonado. Sim, você vai dizer que sou muito precipitado, que a gente nem se conhece... mas não é verdade! Eu acredito em amor à primeira vista, sempre acreditei. Aliás, você é meu amor à primeira, segunda, terceira, quarta vista! E será sempre o meu amor, não importa quantas vezes eu a veja.
Houve um silêncio.
Ela se inclinou sobre a mesa, igualzinho a ele, deu-lhe um beijo na boca e foi embora.
E ele ficou lá na cadeira, olhando ela se afastar.
– Você viu? Ela me beijou! Ela me beijou! Acha que ela vai considerar o que eu disse? – perguntou à garçonete, que retirava a xícara meio-cheia que a moça esquecera. Ele estava em estado de êxtase.
– Aquela moça surda? Acho que não.

Excessos

de
tanto
sorri-te
chorei.

Quem me segue (se perde comigo)